segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Ogun

I

DE COMO OGÚN OFERECEU À SUA ESPOSA OYA SEU AKORO

(Ìyá Sandra Medeiros Epega - Texto extraído do site "JORNAL TAMBOR)

Ògún, o ferreiro de Ire, gostava de sua liberdade. Morava na forja, na última rua da cidade, com sua esposa Oyá, que o ajudava. Sua casa não tinha porta ou janela e o tecto era formado pelas folhas de mariwo, que impediam a chuva e o excesso de sol de incomodá-lo. Ele via os amigos passarem na rua e os saudava com um aceno. Era considerado homem importante, e fora presenteado pela comunidade com um "akoro", pequena coroa de metal que usava com muito orgulho. Pedira ao seu irmão Ode, o caçador, também chamado Osóòssi, que caçasse para ele um enorme touro selvagem que vivia por perto. Tratou o couro do animal e fez dele um enorme fole. Sua esposa Oyá manejava o fole o dia todo, enquanto ele trabalhava na forja, com o calor em seu rosto. E quem passava naquela rua ouvia a música que saia da forja: "Wuuush", fazia o fole. "Lakaiye, lakaiye", ecoavam a bigorna e o martelo. Havia muito trabalho e Ògún e Oyá não paravam nunca.

Uma família resolveu certo dia realizar uma festa para o velho Pai que morrera no ano anterior. Contrataram a Sociedade Egungun da aldeia, cerimónias de propiciação foram feitas pelos Sacerdotes, e o Egungun do velho Pai passeou todo o dia pela cidade, com a família e os amigos atrás, felizes de rever seu Pai de volta ao mercado, tomando sol na praça, andando na estrada, entrando nas casas, brincando e conversando com todos. Bem mais tarde, Egungun passou pela forja, para rever seu amigo ferreiro. E, ao ouvir a música que saia de lá, pôs-se a dançar na rua. Todos ao seu redor riam e gritavam de alegria, Ògún acelerava os movimentos, e o "Lakaiye, lakaiye" saia mais forte. Oyá manejava rapidamente o fole, e ouvia-se "Wuuush, wuuush, wuuush", quase sem parar. O povo aplaudia aquela música e cada vez mais juntava gente ao redor da forja. Ògún estava muito orgulhoso de sua mulher. Ela realmente era muito forte, tinha bom ritmo, sabia como transformar seu fole em um instrumento musical, e com isso encantara e dominara a Egungun, tido como difícil de lidar. A noite caiu e Egungun ainda dançava na rua.
Ògún disse a Oyá que largasse o fole e fosse dançar com Egungun. Ele ao mesmo tempo manejaria o fole e bateria o martelo. E por horas e horas, Oyá e Egungun dançaram e alegraram o povo de Ire. Ògún então tirou seu akoro da cabeça e presenteou com ele sua esposa Oyá, dizendo à ela: "Oyá, iyawo mi, akoro mi lonoon."( Oyá, minha esposa, use meu akoro na rua). E a partir de então, Oyá teve o direito de usar um akoro de metal na cabeça, direito este que conserva até hoje, na velha Mãe África e no novo mundo, sendo a única ayaba que pode fazê-lo, uma vez que seu marido Ògún Alakoro ( o dono do akoro), a autorizou a isto.

Oyá ficou conhecida então como "aquela que usa akoro na rua", "aquela que faz Egungun dançar com a música da forja", "a Mãe que dança com o filho toda a noite sem se cansar", "a poderosa Mãe que conseguiu cansar Egungun", "mulher de Orixá Ògún que recebeu dele o akoro e com ele divide os poderes sobre a forja", "a que tem akoro e o usa na rua, sem que seu dinheiro tenha sido gasto para isso".

AXÉ, AXÉ, AXÉ!

II

ITAN TI ÒGÚN

Ogun era o mais velho e o mais combativo dos filhos de Odudua, o conquistador e rei de Ifé.

Por isto tornou-se o regente do reino quando Odudua, momentaneamente, perdeu a visão.

Ogun era guerreiro sanguinário e temível.

"Ogun, o valente guerreiro,

o homem louco dos músculos de aço!

Ogun, que tendo água em casa,

Lava-se com sangue!"

Ogun lutava sem cessar com os reinos vizinhos. Ele trazia sempre um rico espólio de suas expedições, além de numerosos escravos. Todos estes bens conquistados ele entregava a Odudua, seu pai, rei de Ifé.

Entretando, quando Ogun fez a guerra contra Ogotun, ele trouxe sete mulheres. Uma destas escravas, Lakangê, era tão bonita que ele a escondeu para si, amando-a secretamente.

Mas alguns falsos amigos apressaram-se a denunciá-lo ao seu pai.

Odudua, encolerizado, mandou chamar Ogun e falou-lhe gritando:

"Que atrevimento! Você traz-me seis mulheres, verdadeiras feiuras e, segundo me disseram, você deixou para si a mais bela que parece uma jóia delicada. Ah! Os jovens não têm mais respeito nem consideração por seus pais! Onde vamos chegar com tanta insolência e desrespeito? Ogun, traga-me esta mulher sem mais um minuto de demora!"

Ogun, assustado com a cólera do seu pai, não ousou confessar o que se passava entre ele e Lakangê. Com a morte na alma, ele entregou sua bela mulher a Odudua. Este, encantado, fez dela sua companheira predilecta.

Nove meses mais tarde, Lakangê teve um filho. Para grande surpresa de todos, o corpo do recém-nascido tinha a originalidade de ser metade preto, metade branco.

Metade preto à direita, pois a pele de Ogun era muito escura.

Metade branco à esquerda, pois a pele de Odudua era muito clara.

Odudua olhou para Ogun com ar interrogador. Ogun, confuso, baixou a cabeça e nada soube dizer. Esta criança recebeu o nome de Oranmiyan.

Homem valente à direita,

homem valente à esquerda.

Homem valente em casa,

homem valente na guerra.

Ele foi o fundador do reino de Oyó e o pai de Xangô.

"Ogun, o violento guerreiro,

o homem louco, de músculos de aço.

Ogun, que tendo água em casa,

lava-se com sangue!"

Ogun teve muitas outras aventuras galantes. Ele conheceu uma senhora chamada Elefunlosunlori-"aquela-que-pinta-a-cabeça-com-pós-branco-e-vermelho."
Ela era mulher de Orixá Okô, o deus da agricultura.

De outra feita, indo para a guerra, Ogun encontrou à margem de um riacho uma outra mulher chamada Ojá, e com ela teve o filho Oxossi.

Teve também três outras mulheres que tornaram-se, posteriormente mulheres de Xangô.

Kawo kabiiyesi Alafin Oyó Alayeluwa!

"Saudemos o Rei Xangô, o dono do Palácio de Oyó, Senhor do Mundo!"

A primeira, Iyansan, era bela e fascinante;

a Segunda, Oxun, era coquete e vaidosa;

a terceira, Obá, era vigorosa e invencível na luta.

Ogun continou suas guerras. Durante uma delas, ele tomou Irê. Antigamente, esta cidade era formada por sete aldeias. Por isto chamam-no, ainda hoje, Ogun mejejê lodê Irê, "Ogun das sete partes de Irê".

Ogun matou o Rei Onirê e o substituiu pelo próprio filho, conservando para si o título de Rei.

Ele é saudado como Ogun Onirê! "Ogun Rei de Irê!"

Entretanto, ele foi autorizado a usar apenas uma pequena coroa, "akorô".

Daí ser chamado, também de Ogun Alakorô – "Ogun dono da pequena coroa".

Após instalar seu filho no trono de Irê, Ogun foi-se embora, guerrear durante muitos anos. Quando voltou a Irê, após longa ausência, ela não reconheceu o lugar. Por infelicidade, no dia de sua chegada, celebrava-se uma cerimónia, na qual todo mundo devia guardar silêncio completo.

Ogun tinha fome e sede. Ele viu as jarras de vinho de palma, mas desconhecia que elas já estavam vazias. O silêncio geral pareceu-lhe sinal de desprezo. Ogun, cuja paciência é curta, encolerizou-se. Quebrou as jarras com golpes de espada e depois cortou a cabeça das pessoas.

A cerimônia tendo acabado, apareceu, finalmente, o filho de Ogun e ofereceu-lhe seus pratos predilectos: carne de cachorro, de preferência crua, caracóis com feijão, regado ao dendê, e tudo acompanhado de muito vinho de palma.

Os habitantes de Irê batiam os tambores e cantavam louvores:

"Ogun violento guerreiro,

o homem louco dos músculos de aço.

Ogun, que tendo água em casa,

Lava-se com sangue!"

"Os prazeres de Ogun são o combate e as brigas.

O terrível orixá que se morde a si mesmo sem dó!

Ogun mata o marido no fogo e a mulher no fogareiro.

Ogun mata o ladrão e o proprietário da coisa roubada!"

Ogun arrependido e calmo, lamentou seus actos de violência e disse que já vivera bastante, que viera agora o tempo de repousar.

Ele baixou então sua espada e enterrou-se sob a terra. Ogun tornara-se um Orixá.

III

Ogun vivia em sua aldeia, quando foi requisitado para uma guerra, que não tinha data para acabar. Antes de partir, ele exigiu que seus habitantes dedicassem um dia em sua homenagem, fazendo o sacrifício de jejuar e fazer silêncio absoluto, além de outras oferendas.

Partiu, em sua longa jornada, para os campos de batalha, onde permaneceu sete anos. No regresso à sua aldeia, caminhou durante muitos dias, sentindo muito cansaço. A fome e a sede também o atormentavam. Na primeira casa que encontrou pediu água e comida, mas ninguém o atendeu, permanecendo calados e de olhos fixos no chão.

Resolveu, então, fazer outra tentativa na próxima casa, mas a cena foi a mesma, o que despertou sua ira. Ele esbravejou com os moradores, exigindo que falassem com ele, mas ninguém o fez.

Não se conformava com tamanha falta de respeito, depois de ter lutado tanto!

Ogun esperava uma recepção calorosa em sua própria aldeia, mas, ao contrário, só encontrou silêncio.

À medida que avançava pelo interior da cidade, a mesma coisa se repetia, casa após casa. Ogun nem imaginava o que estava acontecendo. Perguntava e não recebia resposta.

Sua ira já estava incontrolável, quando chegou ao centro do povoado, onde haviam muitas pessoas. Estranhou o fato de ninguém estar conversando. Perguntou a eles onde estavam suas famílias, mas não obteve resposta. Era uma afronta!

Foi assim que, evocando todos os seus poderes, Ogun dizimou sua própria aldeia.

Caçadores que passavam pela cidade, entre eles seu filho, o reconheceram e tentaram aproximar-se. Vendo que sua cólera era imensa, resolveram evocar Exú para acalmá-lo.

A ira desse orixá finalmente foi aplacada. Seu filho, indignado ao ver tanta destruição, indagou o motivo que levou seu pai a cometer tal atrocidade. Ogun respondeu que aquelas pessoas lhe faltaram com respeito quando não o reconheceram. Precisavam de um castigo.

Foi, então, que seu filho o fez lembrar da exigência que fizera antes de partir para a guerra.

Ogun, tomado pelo remorso, devido à sua crueldade com pessoas que só estavam obedecendo ordens, abriu o chão com sua espada enterrando-se de pé.

IV

Orixá Ogun era constantemente procurado por todos que queriam melhorar seu modo de vida. Ensinava como achar mais facilmente um caminho, quais as melhores técnicas para obter bons resultados na caça, e como colher os melhores legumes, raízes e cereais. Era realmente um grande líder. Mas as madeiras usadas pelos homens para trabalhar o solo naquela época, quando Ilu Ayie, a Terra ,ainda era jovem, eram fracas e desgastavam-se logo, reduzindo as possibilidades de boas colheitas. Também a pedra era difícil de trabalhar, facas e lanças se quebravam nas horas mais críticas, e Ogun decidiu que precisaria de um novo material se quisesse manter a liderança da conquista e da agricultura. Procurou um Babalawo, e foi-lhe dito que fizesse ebo. Recomendaram a ele que este ebo fosse colocado em uma praia distante, e ao lado dele fizesse uma fogueira, e quando o fogo estivesse vivo e forte, despejasse dentro dele a areia escura que havia no local.

Quando Ogun jogou a areia na fogueira, notou que uma matéria escura escorria lentamente pelo chão. Quando aquela coisa estranha esfriou um pouco, começou a endurecer e tornou-se tão dura e forte que nada poderia quebrá-la. Ogun então repetiu o processo todo, fazendo em primeiro lugar umas tenazes bem compridas para poder retirar do fogo o material ainda quente e assim poder trabalhá-lo a seu gosto. Quando adquiriu experiência suficiente, Ogun pôde moldá-la em forma de tudo o que sempre quis ter para lavrar a terra, caçar e conquistar inimigos. Estava inventado o ferro, e graças à perseverança, à inteligência e à habilidade de Ogun, o homem não precisaria mais ter fome, porque as pás, enxadas e foices feitas de ferro permitiriam que o solo fosse dominado e desse seus frutos ao agricultor. Seus liderados, bem alimentados, com facas, lanças e espadas de ferro, enfrentariam animais e inimigos, não sendo mais derrotados por homens ou pela natureza. E o povo de Ogun cresceu e se expandiu por toda a região, onde Ogun ficou sendo conhecido como ferreiro, agricultor, caçador e guerreiro, líder do povo yoruba.

Todos os homens a partir de então renderam homenagens a Ogun, pedindo-lhe licença para usar o ferro. O mesmo fizeram os Orixá, pois aquele novo material era muito mais interessante que a madeira e a pedra originais mas Ananburuku, chamada Nanã, velha, decidida, líder incontestável de um grande número de seguidores, rebelou-se quanto a isso. Afinal, ela era tão poderosa quanto Ogun, porque fornecia a matéria prima para a moldagem dos homens, a argila, a lama enviada para Obatalá através de Iku, a morte, com quem convivia diariamente. Ela, Orixá tão poderosa que quando decidira ter filhos não precisara de homens para concebê-los. Ela, regente da morte que devora os homens quando de sua volta ao orun ancestral. Por que deveria louvar Ogun para poder usar o ferro, se estava tão bem usando a madeira, a pedra, a concha, o bambú? E disse não a Ogun, recusando-se a prestar-lhe homenagens, enviar-lhe parte de seus ebo, considerando isso como uma humilhação para alguém como ela, deusa velha e importante do panteão yoruba.

Ogun respondeu que aquele que não o louvasse e honrasse como descobridor e dono do ferro não teria direito de usá-lo. Orixá orgulhoso, manteve seu ponto de vista.

Omolu, também chamado de Obaluaiye, filho mais velho de Ananburuku, sempre respeitoso e devotado à sua Mãe, ficou ao seu lado, proibindo aos seus seguidores o uso, em seu culto, de qualquer instrumento de ferro ou de metal, porque tudo isto pertencia a Ogun. Contentou-se, como sua Mãe, com conchas, palhas, madeira e pedras.

Oxumare, filho mais novo, sempre rebelde e desafiador, pensava por si próprio, gostava de ouro e cobre, apreciava os metais e tudo que brilhasse. Recusou-se a seguir a orientação da Mãe e do irmão mais velho, não vendo nisso desrespeito para com a família, mas tão somente um modo diferente de pensar. E usa lindas peças de metal em seu culto, com elas perfurando as nuvens para que a chuva caia e refresque a terra, fertilizando o solo e propiciando a agricultura.

Todos os outros Orixá recomendaram aos seus adeptos que louvassem Ogun, rendendo-lhe homenagens e enviando-lhe ebo sempre que usassem o metal em seu quotidiano civil e religioso. E Ogun é conhecido e louvado no culto de todos os Orixá, pelo mundo afora.

Mo juba, Orixá Ogun!

V

Ogum foi o segundo filho de Iemanjá e era muito ligado ao irmão mais velho, Exu. Os dois eram muito aventureiros e brincalhões, estavam sempre fazendo estrepolias juntos. Quando Exu foi expulso de casa pelos pais, Ogum ficou muito zangado e resolveu acompanhar o irmão. Foi atrás dele e por muito tempo os dois correram mundo juntos. Exu, o mais esperto, resolvia para onde iriam; e Ogum, o mais forte e guerreiro, ia vencendo todas as dificuldades do caminho. É por isso que Ogum sempre surge no culto logo depois de Exu, pois honrar seu irmão preferido é a melhor forma de agradá-lo; e enquanto Exu é o dono das encruzilhadas, Ogum governa a recta dos caminhos.

VI

Depois que Exu foi expulso de casa pelos pais, ficou decidido que Ogum, o segundo filho, seria o sucessor do pai no governo. Entretanto, Ogum não gostava desse tipo de actividade. Seu prazer estava nas aventuras. Quando substituiu o pai durante uma viagem deste, Ogum deixou de lado as funções de governante, dedicando-se a passeios e confusões com os amigos. Estava sempre se metendo com as namoradas alheias e arrumando brigas. Para mantê-lo sossegado, então, o pai lhe deu o comando do exército e a missão de responder às agressões ao reino e de conquistar novos territórios. Nessas actividades, ele foi muito bem sucedido.

VII

Como é do conhecimento da maioria, Ògún era muito próximo de seu irmão Èsù , os dois eram ligados por uma grande amizade , aventureiros estão ligados por sua primogenitura os dois são quase gémeos, se confundem frequentemente. Os dois estavam sempre juntos, seus domínios e habilidades eram muito semelhantes, dominavam o minério de ferro, e enquanto um era Sr. dos caminhos outro era das encruzilhadas.

Ògún jovem caçador ,filho do Olofin-Oduduwa chefe de Ile-Ifè, quando retornou de uma caçada, estava com muita sede e não encontrou sua bebida dilecta Emu(vinho de palma), muito zangado com seus servos , foi para o alto (òkè) de uma montanha ( monte) onde , gritou ferozmente ou cortou cruelmente do alto da montanha, cobrindo-se de iná (fogo) e èjè (sangue), e vestindo-se somente com mònrìwò (mariwo, folha nova dendezeiro desfiada).

Este Ògún furioso chamado agora pelos yorubas de Soróké, partiu para longe, para outros territórios, furioso foi para longe para outros reinos, para as terras dos Ibos, para o Daome, até para o lado dos Ashantis, sempre furioso, guerreando, lutando, invadindo e conquistando. Com um comportamento furioso e descontrolado, descontando sua ira em seus inimigos ou quem se atrevesse a aparecer no caminho, tal comportamento fez com que muitos ao ver Soróké daquele jeito acreditaram tratar-se de Èsù seu irmão, zangado por não terem pago o que era de direito (talvez seja daí que muitos confundem Soróké, com seu irmão Èsù).

Antes que ele chegasse a Íré, um Olúwo( adivinho , olhador) preveniu aos moradores, que para acalmar Sorókè, deveriam fazer oferendas com Isu (inhame), Àjà (cachorro) muito emu (vinho- de- palma) , e também que deveriam prostrar-se no chão em sinal de respeito , entoando orin (cantigas), e orikis (louvores).

Desta forma quando Sorókè, chegou a Íré, todos fizeram o recomendado, entoaram orin:

" Àkòró gbà àgádá é Ògún gbà àgádá é mòriwò

(O Sr. do Àkòró protege derrubando o inimigo, coberto com folhas novas de palmeira)

Ògún Méjì,

(Ògún usa dois facões)

Ògún Sorókè,

(Ògún grita do alto da montanha)

Ògún Ijá

(Ògún guerreia (luta) "

Recitaram seus Oriki:

"Ojó Ògún Sorókè ntòkè bò ,Aso iná ló mo bora, Ewu Èjè lówò"

( No dia que Ògún Sorókè vinha a montanha , ao invés de roupa usou fogo para se cobrir , e vestiu sangue)

O único que se atreveu a contrariar as recomendações foi o Chefe de Íré , que rapidamente foi morto por Soróké , assim desta forma ,Soróké foi acalmado e se proclamou Oníré,(Sr. de Irê), (deixando posteriormente seu filho Ogundahunsi em seu lugar ).

E quando ele se zanga sai para o àiyé descontando sua ira , e já acalmado volta a Íré ,sendo o Oníré, vitorioso, guerreiro chefe de Ire..."

VIII

Ògún lutava sem cessar contra os reinos vizinhos. Ele trazia sempre um rico espólio de suas expedições, além de numerosos escravos.

Todos estes bens conquistados, ele entregava a Odùduá, seu pai, rei de Ifé.

Ògún continuou suas guerras. Durante uma delas, ele tomou Irê.

Antigamente, esta cidade era formada por sete aldeias. Por isto chamam-no, ainda hoje, Ògún mejejê lodê Irê - "Ògún das sete partes de Irê".

Ògún matou o rei, Onirê e o substituiu pelo próprio filho, conservando para si o título de Rei. Ele é saudado como Ògún Onirê! - "Ogum Rei de Irê!" Entretanto, ele foi autorizado a usar apenas uma pequena coroa, "akorô". Daí ser chamado, também, de Ògún Alakorô - "Ogum dono da pequena coroa".

Após instalar seu filho no trono de Irê, Ògún voltou a guerrear por muitos anos. Quando voltou a Irê, após longa ausência, ele não reconheceu o lugar. Por infelicidade, no dia de sua chegada, celebrava-se uma cerimônia, na qual todo mundo devia guardar silêncio completo.

Ògún tinha fome e sede. Ele viu as jarras de vinho de palma, mas não sabia que elas estavam vazias. O silêncio geral pareceu-lhe sinal de desprezo. Ògún, cuja paciência é curta, encolerizou-se. Quebrou as jarras com golpes de espada e cortou a cabeça das pessoas.

A cerimónia tendo acabado, apareceu, finalmente, o filho de Ògún e ofereceu-lhe seus pratos predilectos: caracóis e feijão, regados com dendê, tudo acompanhado de muito vinho de palma. Ògún, arrependido e calmo, lamentou seus atos de violência, e disse que já vivera bastante, que viera agora o tempo de repousar. Ele baixou, então, sua espada e desapareceu sob a terra.

Ògún tornara-se um òrìsà.

IX

Uma história de Ifá, conta como o número sete foi relacionado com Ogum e o nove com Iansã-Oyá."Oyá era a companheira de Ogun antes de ser mulher de Xangô. Ela ajudava o deus do ferro nos seus trabalhos, carregava dócilmente os seus instrumentos, de casa ao trabalho, ela manejava o fole avivando o fogo da forja. Um dia Ogun ofereceu a Oyá uma vara de ferro semelhante a uma de suas propriedades, a que tinha o dom de dividir em sete partes os homens e em nove as mulheres que por ela fossem tocadas numa luta.

Xangô gostava de sentar-se para ver Ogun golpear os metais, mirando Oyá. Esta, por seu lado, também mirava Xangô furtivamente. Xangô era muito elegante, sendo os seus cabelos trançados como os de uma mulher, usando colares e pulseiras. A sua imponência e o seu poder impressionava Oyá, acabando por ocorrer o que era de esperar, ou seja, um dia Oyá fugiu com Xangô. Ogun lançou-se em sua perseguição, e, encontrando os fugitivos, brandiu a sua vara mágica, Oyá fez o mesmo, tocando-se ambos ao mesmo tempo. Foi assim que Ogun foi dividido em sete partes e Oyá em nove, recebendo o nome de Ogun Mege ou Meje, e Oyá-Iansã em nove, dando origem a "Iamesan" (a mãe transformada em nove). Ogun também está representado por franjas de folhas de palmeira devidamente desfiadas chamadas "Mariwo".

Estas serviram de vestimenta aos "Igba Imole", deuses que foram conduzidos até ao mal, que foram destruídos por Orumale, com a excepção de Ogun, que se tornou o guia ou condutor dos "Irun Imole" deuses que podiam falar sem perigo. Esses "Mariwo" colocados por cima dos portais das vivendas ou entradas dos caminhos, representam a protecção das más influências. Os lugares consagrados a Ogun, são ao ar livre, na entrada dos palácios, casas, negócios, mercados. Estão presentes também na entrada dos templos de outros Orixás.

X

Quem procura o combate? E a vez de Ogun lutar contra Meji!

Metolonfin tinha uma linda filha chamada Meji. O rei, por muito que tentasse, não conseguia arrumar marido para a jovem.

Meji era muito belicosa e guerreira valente, todos os que se apresentavam com a intenção de desposa-la, eram desafiados para um combate singular, e acabaram derrotados pela poderosa princesa.

Desesperado com a situação e temendo que a filha jamais viesse a encontrar um marido, Metolonfin convidou os reis de Aja, de Ke, de Hun e de Ayo, para candidatarem-se ao casamento.

Atendendo ao convite, os quatros reis vieram acompanhados de toda sua corte. Mas Meji não abriu mão de suas exigências, só se casaria com o homem que conseguisse derrotá-la em combate.

O primeiro a amargar a humilhação de derrota, foi Aja Xosu e em seguida, de nobres componentes de sua comitiva: depois foi a vez de Ke Xosu e seus amigos foram derrotados pela bela princesa.

Ogun, que a tudo assistia, foi perguntar a Ifa sob que Odu poderia encontrar protecção para derrotar a nobre guerreira, conquistando assim, o direito de desposá-la.

Na consulta surgiu Ogunda Meji, que ordenou: "Traga um galo, acaçá, azeite de dendê, uma cabaça, um pombo, uma corda e vários pedaços de pano".

Quando Ogun lhe entregou o material, Ifa enfiou na corda, algumas contas, com ela amarrou os pedaços de pano e as pernas do pombo, pegou o galo e enfiou debaixo de suas asas, várias folhas de kpelegun e entregando tudo a Ogun, disse: "Quando partires, deixe o galo em casa e amarre a corda em volta de tua cintura".

No mesmo dia, Ogun desafiou a bela Meji para o combate, durante o qual, a corda que trazia a cintura, rompeu-se e caindo ao chão, embaraçou as pernas da princesa que desequilibrada, caiu derrotada aos pés de Ogun.

No mesmo instante, o galo começou a cantar:

Gbo gbo gbo,

Guda Mejiiii!

(Ogun desposou Meji!).

XI

Ogunda Meji foi procurado por Nã, Vodun mãe de Ifá, que não conseguia parir, uma vez que não possuía nádegas.

Naquele tempo, Ifá tinha seu conhecimento restrito aos acontecimentos do local onde se encontrava. Consultando seu próprio jogo, na esperança de obter uma maior capacidade de predição, encontrou Ogunda Meji, que lhe pediu um peixe como sacrifício.

Sabedor de que Nã possuía em sua casa um poço para criação de peixes (Togodo). Ifa pediu-lhe que lhe trouxesse um, para que pudesse fazer o ebó.

Os dias se passaram e como Nã não trouxesse o eja, Ifá, que possuía uma cabaça, pegou-a e dirigiu-se a casa de Nã.

Lá chegando, dirigiu-se ao poço e com sua cabaça, começou a retirar água de seu interior, para deixar os peixes a seco, o que facilitaria sua tarefa.

Vendo o que estava acontecendo, Nã protestou, afirmando que o Babalawo que havia consultado, também havia lhe pedido um peixe como sacrifício, mas ela não possuía cabaça, o que impedia que capturasse um peixe em seu próprio poço.

Combinaram, que quando toda a água tivesse sido retirada, os peixes encontrados seriam repartidos entre os dois, acontecendo no entretanto, que quando a água acabou, somente um único peixe foi encontrado no fundo do poço.

Nã reclamou o peixe para si sob a alegação de que o poço se encontrava em seu quintal e que tudo o que estivesse dentro dele lhe pertencia.

Por sua vez, Ifá considerava-se dono do peixe, já que fora ele quem com a cabaça de sua propriedade, o havia capturado, o que certamente não poderia ter sido feito por Nã.

A discussão prolongava-se sem que ninguém cedesse seu direito sobre o peixe.

Naquele tempo, o Vodun Gu, que já havia consultado o Oráculo e feito o seu sacrifício, recebeu um gubasa. do qual jamais se separava. Como passasse pelo local em suas andanças em busca de caça, foi chamado a intervir como árbitro da questão.

Gu ordenou então, que Ifá segurasse o peixe pela cabeça e que Nã o segurasse pelo rabo, puxando com firmeza, cada qual para seu lado, ao mesmo tempo em que mantinham os olhos bem fechados.

Com um rápido golpe de seu afiado gubasa, Gu dividiu o eja em duas partes e depois, ordenou que Nã ficasse com a cauda do peixe e fizesse com ela o sacrifício, para que pudesse obter nádegas, que permitiriam que viesse a parir filhos como todas as mulheres. Ifá ficou com a parte da cabeça, que ofereceu em sacrifício ao seu próprio Ori, para fortificá-lo para melhor capacitá-lo para suas funções.

Foi assim que Nã, colocando a cauda do Peixe abaixo de sua cintura, logrou vê-la transformada em nádegas, enquanto Ifá oferecendo a cabeça do peixe ao seu ori, teve sua capacidade de previsão aumentada infinitamente.

Depois disto, costuma-se dizer:

"Gu da eja-meji"

(Ogun partiu o peixe em dois).

XII

Ogun Badagli, era o chefe das tropas de Oduduwa. Um dia, Oduduwa ordenou que seu general, à frente de seus exércitos, invadisse e dominasse a cidade de Igbo, para ali estabelecer o seu domínio.

Quando Ogun Badagli invadiu a cidade, conheceu ali uma belíssima jovem, filha do rei de Igbo, por quem se apaixonou e tomou como mulher.

Era costume, que todos os despojos de guerra, deveriam ser entregues ao rei vencedor e Ogun Badagli entregou a Oduduwa, tudo o que havia trazido da cidade saqueada, com excepção da mulher pela qual havia se apaixonado.

Informado de que seu general havia ocultado uma prisioneira, Oduduwa exigiu que esta lhe fosse entregue. Maravilhado pela beleza da jovem, o rei conduziu-a a seus aposentos, onde a possuiu. Dez luas depois, a mulher deu à luz um menino, que tinha o lado esquerdo negro e o lado direito inteiramente branco, filho que era de dois pais. Ogun Badagli, de pele negra e Oduduwa, de pele branca como a neve.

Ao recém nascido foi dado o nome de Oraniyan.

XIII

Ogum (do iorubá Ogún) é o guerreiro, general destemido e estratégico, é aquele que veio para ser o vencedor das grandes batalhas, o desbravador que busca a evolução.

Defensor dos desamparados, Ogum andava pelo mundo comprando a causa dos indefesos, sempre muito justo e benevolente. Ele era o ferreiro dos orixás, senhor das armas e dono das estradas.

Filho de Yemanjá com Oxalá, é irmão gémeo de Elegbará (Eshu), por isso tem algumas características iguais, como a irreverência, pois é um orixá valente, traz na espada tudo o que busca.

Ele teve um único filho com Iansã, Logum Edé, mas não pôde criá-lo por estar sempre envolvido em batalhas.

Protector dos policiais, ferreiros, escultores, caminhoneiros e todos os guerreiros.

XIV

Disputa entre NANÃ BURUKU e OGUM

Nanã Buruku é uma velhíssima divindade das águas, vinda de muito longe e há muito tempo. Ogum é um poderoso chefe guerreiro que anda, sempre, à frente dos outros Imalés. Eles vão, um dia, a uma reunião. É a reunião dos duzentos Imalés da direita e dos quatrocentos Imalés da esquerda. Eles discutem sobre seus poderes. Eles falam muito sobre Obatalá, aquele que criou os seres humanos. Eles falam sobre Orunmilá, o senhor do destino dos homens. Eles falam sobre Exú: "Ah! É um importante mensageiro!" Eles falam muita coisa a respeito de Ogum. Eles dizem: "É graças a seus instrumentos que nós podemos viver. Declaramos que é o mais importante entre nós!" Nanã Buruku contesta então: "Não digam isto. Que importância tem, então, os trabalhos que ele realiza?" Os demais orixás respondem: "É graças a seus instrumentos que trabalhamos pelo nosso alimento. É graças a seus instrumentos que cultivamos os campos. São eles que utilizamos para esquartejar." Nanã conclui que não renderá homenagem a Ogum. "Por que não haverá um outro Imalé mais importante?" Ogum diz: "Ah! Ah! Considerando que todos os outros Imalés me rendem homenagem, me parece justo, Nanã, que você também o faça." Nanã responde que não reconhece sua superioridade. Ambos discutem assim por muito tempo. Ogum perguntando: "Você pretende que eu não seja indispensável?" Nanã garatindo que isto ela podia afirmar dez vezes. Ogum diz então: "Muito bem! Você vai saber que eu sou indispensável para todas as coisas." Nanã, por sua vez, declara que, a partir daquele dia, ela não utilizará absolutamente nada fabricado por Ogum e poderá, ainda assim, tudo realizar. Ogum questiona: "Como você fará? Você não sabe que sou o proprietário de todos os metais? Estanho, chumbo, ferro, cobre. Eu os possuo todos." Os filhos de Nanã eram caçadores. Para matar um animal, eles passaram a se servir de um pedaço de pau, afiado em forma de faca, para o esquartejar. Os animais oferecidos a Nanã são mortos e decepados com instrumentos de madeira. Não pode ser utilizada a faca de metal para cortar sua carne, por causa da disputa que, desde aquele dia, opôs Ogum a Nanã.

XV

Ogum dá ao homem o segredo do ferro.

Na Terra criada por Obatalá, em Ifé, os orixás e os seres humanos trabalhavam e viviam em igualdade. Todos caçavam e plantavam usando frágeis instrumentos feitos de madeira, pedra ou metal mole. Por isso o trabalho exigia grande esforço. Com o aumento da população de Ifé, a comida andava escassa. Era necessário plantar uma área maior.

Os orixás então se reuniram para decidir como fariam para remover as árvores do terreno e aumentar a área de lavoura. Ossain, o orixá da medicina, dispôs-se a ir primeiro e limpar o terreno. Mas seu facão era de metal mole e ele não foi bem sucedido. Do mesmo modo que Ossain, todos os outros Orixás tentaram, um por um, e fracassaram na tarefa de limpar o terreno para o plantio. Ogun, que conhecia o segredo do ferro, não tinha dito nada até então. Quando todos os outros Orixás tinham fracassado, Ogun pegou seu facão, de ferro, foi até a mata e limpou o terreno. Os Orixás, admirados, perguntaram a Ogun de que material era feito tão resistente facão. Ogun respondeu que era o ferro, um segredo recebido de Orunmilá. Os Orixás invejaram Ogun pelos benefícios que o ferro trazia, não só à agricultura, como à caça e até mesmo à guerra.

Por muito tempo os Orixás importunaram Ogun para saber do segredo do ferro, mas ele mantinha o segredo só para si. Os Orixás decidiram então oferecer-lhe o reinado em troca do que ele lhes ensinasse tudo sobre aquele metal tão resistente. Ogun aceitou a proposta. Os humanos também vieram a Ogun pedir-lhe o conhecimento do ferro. E Ogun lhes deu o conhecimento da forja, até o dia em que todo caçador e todo guerreiro tiveram sua ança de ferro. Mas, apesar de Ogun ter aceitado o comando dos Orixás, antes de mais nada ele era um caçador. Certa ocasião, saiu para caçar e passou muitos dias fora numa difícil temporada. Quando voltou da mata, estava sujo e maltrapilho. Os Orixás não gostaram de ver seu líder naquele estado. Eles o desprezaram e decidiram destituí-lo do reinado. Ogun se decepcionou com os Orixás, pois, quando precisaram dele para o segredo da forja, eles o fizeram rei e agora dizem que não era digno de governá-los. Então Ogun banhou-se, vestiu-se com folhas de palmeira desfiadas, pegou suas armas e partiu. Num lugar distante chamado Irê, construiu uma casa embaixo da arvore de Acoco e lá permaneceu. Os humanos que receberam de Ogun o segredo do ferro não o esqueceram. Todo mês de dezembro, celebravam a festa de Uidê Ogun. Caçadores, guerreiros, ferreiros e muitos outros fazem sacrifícios em memória de Ogun. Ogun é o senhor do ferro para sempre.

[ Lenda 31 do Livro Mitologia dos Orixás de Reginaldo Prandi ]

XVI

Ogum torna-se o rei de Irê.

Quando Odudua reinava em Ifé, mandou seu filho Ogun guerrear e conquistar os reinos vizinhos. Ogun destruiu muitas cidades e trouxe para Ifé muitos escravos e riquezas, aumentando de maneira fabulosa o império de seu pai. Um dia, Ogun lançou-se contra a cidade de Irê, cujo povo o odiava muito. Ogun destruiu tudo, cortou a cabeça do rei de Irê e a colocou num saco para dá-la a seu pai. Alguns conselheiros de Odudua souberam do presente que Ogun trazia para o rei seu pai. Os conselheiros disseram a Odudua que Ogun desejava a morte do próprio pai para usurpar-lhe a coroa. Todos sabem que um rei deve ver a cabeça decepada de outro rei. Ogun não conhecia esse tabu. Odudua imediatamente enviou uma delegação para encontrar Ogun fora dos portões da cidade. Após muitas explicações, Ogun concordou em entregar a cabeça do rei de Irê aos mensageiros de Odudua. O perigo havia acabado. Ogum fora encontrado antes de chegar ao palácio de seu pai. Como Odudua queria recompensar o seu filho mais querido, presenteou Ogun com o reino de Irê e todos os prisioneiros e riquezas conquistadas naquela guerra.

Assim Ogun tornou-se o Onirê, o rei de Irê.

[ Lenda 32 do Livro Mitologia dos Orixás de Reginaldo Prandi ]

XVII

Ogum livra um pobre de seus exploradores.

Um pobre homem peregrinava por toda parte, trabalhando ora numa, ora noutra plantação. Mas os donos da terra sempre o despediam e se apoderavam de tudo o que ele construía. Um dia esse homem foi a um babalawo, que o mandou fazer um ebó na mata. Ele juntou o material e foi fazer o despacho, mas acabou fazendo tal barulho que Ogun, o dono da mata, foi ver o que ocorria. O homem, então, deu-se conta da presença de Ogun e caiu a seus pés, implorando seu perdão por invadir a mata. Ofereceu-lhe todas as coisas boas que ali estavam. Ogum aceitou e satisfez-se com o ebó. Depois conversou com o peregrino, que lhe contou por que estava naquele lugar proibido. Falou-lhe de todos os seus infortúnios. Ogun mandou que ele desfiasse folhas de dendezeiro, mariwo, e as colocasse nas portas das casas de seus amigos, marcando assim cada casa a ser respeitada, pois naquela noite Ogun destruiria a cidade de onde vinha o peregrino. Seria destruído até o chão. E assim se fez.

Ogun destruiu tudo, menos as casas protegidas pelo mariwo.

[ Lenda 43 do Livro Mitologia dos Orixás de Reginaldo Prandi ]

XVIII

Ogum chama a Morte para ajudá-lo numa aposta com Xangô.

Ogun e Xangô nunca se reconciliaram. Vez por outra degladiavam-se nas mais absurdas querelas. Por pura satisfação do espírito belicoso dos dois. Eram, os dois, magníficos guerreiros. Certa vez Ogun propôs a Xangô uma trégua em suas lutas, pelo menos até que a próxima lua chegasse.

Xangô fez alguns gracejos, Ogun revidou, mas decidiram-se por uma aposta, continuando assim sua disputa permanente. Ogun propôs que ambos fossem à praia e recolhessem o maior número de búzios que conseguissem. Quem juntasse mais, ganharia. e quem perdesse daria ao vencedor o fruto da coleta. Puseram-se de acordo.

Ogun deixou Xangô e seguiu para a casa de Oiá, solicitando-lhe que pedisse a Iku que fosse à praia no horário que tinha combinado com Xangô. Oiá aquiesceu, mas exigiu uma quantia em ouro como pagamento, que recebeu prontamente. Na manhã seguinte, Ogun e Xangô apresentaram-se na praia e imediatamente a competição começou. Cada um ia pegando os búzios que achava. Vez por outra se entreolhavam. Xangô cantarolava sotaques jocosos contra Ogun. Ogun, calado, continuava a colecta. O que Xangô não percebeu foi a aproximação de Iku. Ao erguer os olhos, o guerreiro deparou com a morte, que riu de seu espanto. Xangô soltou o saco da colecta, fugindo amedrontado e escondendo-se de Iku. À noite Ogun procurou Xangô, mostrando seu espólio. Xangô, envergonhado, abaixou a cabeça e entregou ao guerreiro o fruto de sua colecta.

[ Lenda 44 do Livro Mitologia dos Orixás de Reginaldo Prandi ]

XIX

A QUIZILA DE OGUM COM O QUIABO

Você sabe porque Ogum não gosta de quiabo? Foi por causa de uma contenda dele com Xangô. Xangô era muito ambicioso por status, principalmente pelo título de rei, por se sentar no trono de um reinado. Foi o que aconteceu com a cidade de Oyó.

Xangô estava para entrar em Oyó, com a sua comitiva, quando avisaram Ogum. O povo pediu a sua ajuda pois ele era um grande guerreiro, e Ogum não se negou. Mas, como em tudo existe falsidade, a notícia de que Ogum estava contra Xangô vazou. Xangô, sabendo, tomou as suas atitudes. Ele tramou uma cilada para Ogum. Mandou comprar muito quiabo em todas as aldeias e mandou picar. Fez uma pasta com o quiabo. Pelo lado em que ele ia atacar a cidade tinha uma ladeira. O que ele fez? Mandou espalhar que o ataque era naquele dia. Aí mandou espalhar o quiabo ladeira abaixo. Já viu como ficou né? Ninguém se segurava. Escorregavam todos ladeira abaixo. Foi assim que, quando Ogum apareceu no caminho, pensando que ia vencer Xangô, todos os seus cavaleiros, até mesmo ele, desceram ladeira baixo e os seus cavalos quebravam as pernas. Assim Xangô tomou posse da cidade de Oyó e a comandou por todo um século. Esta história me foi contada por minha avó. É por isso que Ogum não suporta quiabo.

XX

O escravo de Oggún

Oggún nunca encontrava a maneira de conservar a forja acesa para terminar os seus trabalhos de ferreiro. Um dia lamentava-se pelo que lhe sucedia e um seu amigo. O fole que passava por ali, preocupado perguntou-lhe:

- Amigo Oggún, que se passa que te vejo tão preocupado?

E este respondeu-lhe:

- É que a forja não se mantém acesa e tenho o trabalho atrasado.

O fole viu o que acontecia e disse:

- Não te preocupes que te vou ensinar a maneira de saíres de apuros. Amarra-me na boca da forja, com a minha boca dentro dela, dá às minhas pernas e verás que como eu vou assoprar, o fogo da tua forja não se apaga.

Desta maneira se fez e Oggún obteve o resultado esperado.

No outro dia o fole disse ao seu amigo:

- Bem, como já sabes qual é o segredo solta-me e quando voltares a necessitar te servirei de novo.

Mas Oggún respondeu:

- Libertar-te? Nem penses... Eu necessito de ti a toda a hora".

E desde esse momento o fole foi o escravo de Oggún.

XXI

Oggún premeia a humildade de um estrangeiro

Oggún vivia no monte perto de uma próspera cidade. Um dia chegou um estrangeiro à dita cidade pedindo hospitalidade e os seus habitantes o acolheram. Sentindo-se bem, o estrangeiro decidiu estabelecer-se na cidade sendo aceite e depois de um certo tempo entregaram-lhe as terras dum pequeno monte para que as cultivasse. Assim o fez, tendo uma boa colheita, pois que nesse ano fez bom tempo nas terras altas. No ano seguinte os moradores da cidade insistiram de que desta vez devia cultivar no vale. O estrangeiro assim o fez, obtendo uma melhor colheita devido a que nesse ano choveu muito nas terras altas, prejudicando-as e beneficiando as que ele tinha trabalhado no vale.

A hospitalidade dos moradores converteu-se em intriga, inveja e más intenções e armaram um plano contra o estrangeiro para o ano seguinte. Desta vez mandaram-no semear na montanha com a intenção de que Oggún o matasse ao sentir seus territórios invadidos por um estranho. Quando se encontraram na montanha, o estrangeiro em vez de se assustar, ofereceu comida a Oggún e este, em agradecimento decidiu premiá-lo, dizendo-lhe: "Mandaram-te à montanha para que te matasse mas eu vou converter-te em Rei".

No centro da cidade todos esperavam pela notícia da morte do estrangeiro e nisso apareceu Oggún com seu machete na mão, causando morte e destruição. Os delegados da cidade perguntaram-lhe o motivo da sua fúria e ele respondeu: "Quero que aquele que mandaram ao meu território sob engano, seja convertido em Governador da cidade. Só assim me acalmarei."

XXII

Nada escapa da justiça de Oggún

As divindades do vento, do trono e do segredo eram amigas e um dia decidiram-se a mostrar as suas proezas individuais. Xangó disse que ele só sabia dançar, Eziza disse que sabia como transformaras coisas, enquanto que Oro disse que ele só sabia lutar.

Entretanto os três dirigiram-se para o mercado onde se encontraram com a mãe de Eziza vendendo artigos medicinais. Também se encontraram com a mãe de Xangô que estava vendendo azeite de palma, enquanto que a mãe de oro vendia água. Passado pouco tempo de ali estarem sentiram fome e foi esse o momento de por à prova as suas capacidades. Eles propuseram que Eziza devia preparar-se para roubar algo de comer. Ele se transformou rapidamente num vento muito forte, o qual roubou a água da mãe de Oro, azeite de palma da mãe de Xangô e carne de sua própria mãe, ainda sem conhecer as vítimas do seu roubo. Mais tarde quando se reuniram para comer o que Eziza havia roubado, houve constrangimento no mercado e as três mulheres estiveram queixando-se de que ladrões desconhecidos lhes haviam roubado os seus produtos. Elas decidiram-se a ir a casa para alertar os seus filhos do que lhes tinha sucedido. Entretanto, os três filhos estavam descansando depois de comer na confluência dos três caminhos, quando apareceu ante eles um caçador, que, ao perceber o que os três homens provavelmente tinha feito, repetiu o seguinte conjuro:

Orita meta, amidi kugo. Bebe ondaamidi, gere gere. Misi aldufe.

No momento em que o caçador chegou à bifurcação do caminho, o seu conjuro havia colocado os três homens num profundo sono. Depois de o caçador partir, eles foram despertados pelos gritos de suas mães. Nenhum deles conhecia a mãe do outro. Cada um tomou um dos três caminhos convergentes na intersecção. Conforme as mulheres se foram aproximando entre lamentos, Xangô agarrou a mãe de Oró, Oró capturou a de Ezizá e Ezizá a de Xangô.

A mãe de Xangô saudou a seu filho pelo seu verdadeiro nome, Aremú Olufinran e com esse chamado os três homens soltaram as suas respectivas cativas. As mulheres narraram como lhes haviam roubado às três os seus artigos e eles ao aperceberem-se do sucedido, olharam uns para os outros com assombro e os olhares caíram todos sobre Eziza ao que lhe perguntaram se a sua valentia se manifestava unicamente em roubar as suas próprias mães. Ele respondeu que não havia problema algum porque eles tinham comido a comida das suas mães.

Nesse instante, o caçador, que desde então estava observando oculto num esconderijo, surgiu para decidir sobre as acções dos três homens. Ele decidiu que a partir daquele momento, Ezizá só seria capaz de roubar a qualquer pessoa na selva, Xangô deveria continuar com a sua vida de dançarino, enquanto que Oro deveria desaparecer na selva.

A mãe de Xangô ficou aborrecida e decidiu regressar à casa do seu pai, no povoado de Takpa. Alafi Atiba, que se havia convertido no Rei de Oyó, foi entregue à mãe de Xangô em troca de Elenkre Adodo, o Rei de Takpa. Oro foi amaldiçoada a nunca ter um altar.

O caçador era Oggún.

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